Naquele Dia de Chuva - Um Conto de Jady Santos

Publicado em 29/07/2015


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     Era uma tarde chuvosa, um dia de inverno, um início de semana e, quase desempregada, meus dias estavam cada vez mais tenebrosos. Porém, nada se comparava àquela tarde em que me surpreendi.
   
     Eu estava abrindo a porta de casa. Iria para mais uma reunião aonde meu chefe, novamente, me mostraria o quanto os outros são melhores do que eu. Ao olhar para o céu reparei na enorme nuvem escura que se aproximava. Peguei o guarda-chuva, abri o portão e segui para a calçada. Ouvi os passos das pessoas que andavam pelas ruas, cachorros latindo, crianças gritando e dizendo que não queriam ir para a escola. Tudo isso fez a minha mente inundar-se com muitas informações e lembranças. Recordava-me e refletia sobre o que eu havia feito com a minha vida, dos dias em que eu poderia ter me divertido mais e, talvez, estivesse sendo mais feliz. Infelizmente, é impossível retornar ao passado, por isso devemos viver o futuro.

     Amigos? Não tinha. Podia me considerar uma pessoa antissocial. Tinha que admitir que a verdade é que eu, realmente, achava que não tinha coragem suficiente para fazer amizades ou, nem mesmo, um esforço para fazer com que as pessoas gostassem de mim. Era raro a ocasião em que eu me sentia à vontade para abrir-me com alguém, normalmente eu era difícil. Eu era como aquela nuvem escura, com a exceção de que logo ela descarregaria toda a água e eu, pelo contrário, manteria meus segredos para mim.

     Tinha um carro, mas procurava não dirigir. Preferia ir a pé, observar o mundo e fazer uma boa caminhada. Meu trabalho ficava apenas a algumas quadras de casa, então não tinha o que reclamar. Sentia o vento chocar-se contra as minhas costas e agir com mais força em seguida à chuva. Abri a sombrinha rapidamente. Faltava apenas uma quadra, eu tinha que apertar o passo antes que a chuva aumentasse. E fora nesse meio tempo que tudo aconteceu, realmente tudo.

     O vento aumentava e pessoas corriam para se proteger. Então, alguém "bateu" em mim e derrubou a minha mala. Quando havia tentado pegar meu guarda-chuva, o mesmo quebrou e fora levado pelo vento. Esqueci-me da minha sombrinha e peguei as coisas que caíram da minha mala. Quando a chuva começou a parar, uma sombra ficou ao meu redor, então percebi que a chuva não havia acabado. Alguém estava atrás de mim com uma sombrinha grande.

— Será que posso ajudar?  Ouvi uma voz masculina e familiar.

     Quando olhei para trás confirmei a minha ideia. Era ele, aquele a quem eu não gostaria de encontrar.

— Sim, claro, por favor.  Ele segurou minhas mãos e me ajudou a levantar, em seguida olhou nos meus olhos.

— Parece assustada. Espero que não tenha perdido nada.
   
— Como se você se importasse.

— Na verdade, eu me importo.

     Eu estava confusa, muito confusa. Por que agora ele diz que se importa? Como? Era o que eu pensava. Eu fazia as coisas da melhor maneira possível e ele sempre dizia que podia ser melhor, então eu tentava dar o meu melhor. Mas ele nunca viu isso em mim, até que um dia eu disse que bastava. Eu havia dito que ele teria que acertar daquele modo porque aquele fora o meu melhor. A reação dele foi um sorriso e eu jurava que seria despedida (no momento certo). Porém, naquele momento ele dizia que se importava.

— Eu acho que não se importa o suficiente.

— Por que você acha isso?

— Por que não olha para si mesmo? Lembre todas as palavras que falou pra mim. Você me deixou com raiva. Eu dizia que aquilo era o que eu sabia fazer...
   
— E então você fazia melhor, admiro isso. Você merece muito mais que aquele emprego, sabia?

— E por que me diz isso se vai me demitir?
   
— Não irei te demitir.

— Bem, então o que foi aquele sorriso quando gritei com você?
   
— Admiração. Consegui fazer o que eu queria: dar a garota perfeita o melhor cargo.

Então, nossos olhares se encontraram e ele, novamente, deu aquele sorriso.

— Então tudo aquilo foi por que acreditava em mim?  Senti um pequeno calafrio.

— Sim. E a partir de hoje você será a sub chefe e a minha amiga em particular. Se você aceitar, é claro.

Uau! Minha vida estava virando um sonho! Tudo estava se encaixando, menos a palavra amiga. Eu percebi que quando ele falou essa palavra seus olhos brilharem e meus lábios darem um pequeno sorriso.

— Vendo as propostas, acho que seria impossível recusar.

— Hora de trabalhar, então.

     A chuva foi ficando mais forte. Ele segurou a minha cintura; eu senti um pequeno desconforto de início, porém aquilo me deixou esquisita em um bom sentido. Juntos fomos para o prédio da empresa, naquele dia de chuva que mudara a minha vida.

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